-Pronto? Está gravando?
- só um momento.
- Olha não sei ao certo como me expressar.
-Ok, bora lá então.
- Olá! Eu me chamo Amina e como paciente dessa instituição fui convidada a falar um pouco de mim e do meu caso. Sendo assim, tentarei ser breve e espero que essa gravação de algum modo sirva pra alguém com sintomas semelhantes. Não sou santa, nem um pouco "boa menina" e detesto olhar de bom samaritano. Pelo contrário, tenho um egoísmo tão egoísta que não quero ninguém vivendo ou sentindo minhas dores.
-É...
- Eu...
- Quero deixar bem claro: Estou aqui, mas não me sinto uma fraca.
- Por isso uma palavra que não me deixa, mesmo com toda essa medicação que vocês me empurram, é a palavra grandeza.
- Olha, sei que parece ridículo, mais imagino que todos temos nossos demônios, ou dito de forma menos obscura: todos nós temos sentimentos, que no fim se tornam em neuroses e as neuroses por sua vez podem ganhar outros agravantes... tipo, fobias entende? É dessa forma que me olho no espelho todo dia: como uma garota imersa em fobias. Tenho varias ideias e teorias sobre esse assunto. Mas penso que a definição mais sucinta e precisa para o termo nesse momento é o diagnóstico do meu médico sobre meu caso. Fobias são reações emocionais e físicas a objetos e situações temidas. Sentimento de pânico, ameaça constante, horror ou terror. Reconheço que o meu medo ultrapassa os limites. E sei que tudo isso é sem sentido para muita gente. Mas, essa sou eu. E não é nada fácil olhar nos olhos de uma pessoa quando estou assim. É... Não sei se são reações automáticas que estão fugindo do meu controle. Às vezes até tento brincar com minha situação. Tento ser forte sabe? Mesmo quando sua tomada por um sentimento de vazio. Poxa, ontem mesmo falei pra moça responsável pela terapia ocupacional que nem sempre é fácil ser eu.
- Como assim Amina? Melhor dizendo: você sabe quem é realmente?
-Então, eu diria com toda sinceridade do mundo que não sei quem sou, mas sei o que não sou.
- É... Senhor Hans Von Liszt uma coisa devo lhe assegurar, não sou como ele. Bem queria, mas os meus olhos, quando foram abertos fez com quer eu perdesse uma coisa incrível ingênua e sem malícia mesmo guardando sua luz no mais sagrado, arremessando-me de um lado para outro, despojando-me de toda minha vontade de vida, toda minha ternura. Arrancaram minha calma quando abriram meus olhos para um mundo sem vida que enruga e racha a alma. Hoje não sei quem sou, talvez uma escultura, sem afetos, desgastada pelo tempo em um canto empoeirado miseravelmente mal quista. Ainda assim rastejo, lenta como as horas que me pesam, eu rastejo, sem deixar de lado minhas quimeras infantís. E mesmo que meu espírito esteja decorado com sentimentos líricos que de sorte me abraçam. Deixei de ser feliz quando o “mundo de vocês” abriu os meus olhos. Agora estou acordada e mundo de vocês? Dorme feito criança, desprezando os infortúnios da vida. Doutor, antes de terminar eu tenho uma pergunta... Como fechamos os olhos para nós mesmos?
Por Claudio Castoriadis ( trecho do meu conto Onde as horas não passam)
Mais informações http://claudiosloterdijk.tumblr.com/
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