Nascido em 1927 em Lüneburg, Niklas Luhmann produziu, a partir de meados dos anos 60 até à sua morte, em 1998, um intelectual de peso nos meios acadêmicos, único pela sua dimensão, pluralidade temática e, sobretudo, colossal ambição teórica, se tornou uma referência incontornável muito para além das fronteiras académicas habituais da sociologia. O intuito do sociólogo de Bielefeld, cidade onde viveu boa parte da sua vida e em cuja Universidade se desenrolou quase toda a sua carreira académica (mais precisamente, de 1968 até à jubilação, em 1993), não se limitou à elaboração de uma teoria social capaz de tornar visíveis, caracterizar e explicar os aspectos centrais da sociedade moderna e da cultura da modernidade. A sua ambição vai ainda mais longe, na medida em que inclui a tentativa de renovar em profundidade as categorias do modo ocidental de pensar o homem e a sociedade, a que a tradição chamou “filosofia prática”, ou mesmo as categorias do pensar enquanto tal, que seriam igualmente as do ser, e que a tradição tematizou sob o nome de ontologia ou metafísica. É, desta feita, uma tradição provocadoramente apelidada de alteuropäisches Denken (pensamento velho europeu) que a ambição teórica de Luhmann desafia. E é um propósito teórico tão “totalitário” que torna compreensível uma afirmação como a do filósofo Robert Spaemann, para quem (se a teoria dos sistemas da Luhmann devesse ser comparada, numa comparação de teorias, com uma qualquer figura filosófica, uma tal figura só poderia ser a de Hegel). Um autor contundente e complexo em sua estrutura conceitual principalmente quando o mesmo tem uma assombrosa facilidade de ser qualificado como um filósofo. E de fato, muitos o enquadram nessa roupagem: na figura de um filósofo. Porém, é importante lembrar que a sua teoria dos sistemas não é uma filosofia propriamente dita. Spaemann tem toda a razão em considerá-la como (a forma mais moderna da não-filosofia). Esta afirmação não constitui, de modo algum, um juízo depreciativo, a denegação de dignidade filosófica ao pensamento de Luhmann, mas a simples constatação factual de uma partilha de tarefas, ou, em termos luhmannianos, de uma diferenciação funcional. A teoria como “não-filosofia” apenas tornaria transparente, inteligível, “o que acontece” , ou seja, de que modo os sistemas sociais resolvem o problema universal de reduzir a complexidade do mundo.