quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

A Pequena Vendedora de Fósforos (Roger Allers, 2006)


A Pequena Vendedora de Fósforos, curta-metragem de animação, presenteia as almas mais sensíveis baseado no conto de Hans Christian Andersen (1805-1875), escritor e poeta dinamarquês. A Pequena Vendedora de Fósforos se trata de uma breve e bela história sobre uma garota pobre que busca na venda de seus fósforos um meio de sobrevivência. O diretor Roger Allers chegou a declarar que quando criança, não conseguia chegar ao fim desse conto sem chorar. Hans Christian Andersen, consagrado por obras primas dos contos infantis como O Soldadinho de Chumbo (Publicado nesse blog) e A Pequena Sereia, teve mais uma de suas belas histórias contada em forma de filme. O curta de aproximadamente 7 minutos é de uma sutileza incomensurável.



A Pequena Vendedora de Fósforos-  Hans Christian Andersen (1805-1875)


Fazia um frio terrível; caía a neve e estava quase escuro; a noite descia: a última noite do ano. Em meio ao frio e à escuridão uma pobre menininha, de pés no chão e cabeça descoberta, caminhava pelas ruas. Quando saiu de casa trazia chinelos; mas de nada adiantavam, eram chinelos tão grandes para seus pequenos pézinhos, eram os antigos chinelos de sua mãe. A menininha os perdera quando escorregara na estrada, onde duas carruagens passaram terrivelmente depressa, sacolejando. Um dos chinelos não mais foi encontrado, e um menino se apoderara do outro e fugira correndo. Depois disso a menininha caminhou de pés nus - já vermelhos e roxos de frio.


Dentro de um velho avental carregava alguns fósforos, e um feixinho deles na mão. Ninguém lhe comprara nenhum naquele dia, e ela não ganhara sequer um níquel. Tremendo de frio e fome, lá ia quase de rastos a pobre menina, verdadeira imagem da miséria! Os flocos de neve lhe cobriam os longos cabelos, que lhe caíam sobre o pescoço em lindos cachos; mas agora ela não pensava nisso. Luzes brilhavam em todas as janelas, e enchia o ar um delicioso cheiro de ganso assado, pois era véspera de Ano-Novo.


Sim: nisso ela pensava!


Numa esquina formada por duas casas, uma das quais avançava mais que a outra, a menininha ficou sentada; levantara os pés, mas sentia um frio ainda maior. Não ousava voltar para casa sem vender sequer um fósforo e, portanto sem levar um único tostão. O pai naturalmente a espancaria e, além disso, em casa fazia frio, pois nada tinham como abrigo, exceto um telhado onde o vento assobiava através das frinchas maiores, tapadas com palha e trapos. Suas mãozinhas estavam duras de frio. 

Ah! bem que um fósforo lhe faria bem, se ela pudesse tirar só um do embrulho, riscá-lo na parede e aquecer as mãos à sua luz!


Tirou um: trec! O fósforo lançou faíscas, acendeu-se. Era uma cálida chama luminosa; parecia uma vela pequenina quando ela o abrigou na mão em concha...

Que luz maravilhosa!


Com aquela chama acesa a menininha imaginava que estava sentada diante de um grande fogão polido, com lustrosa base de cobre, assim como a coifa. Como o fogo ardia! Como era confortável!


Mas a pequenina chama se apagou, o fogão desapareceu, e ficaram-lhe na mão apenas os restos do fósforo queimado.


Riscou um segundo fósforo.


Ele ardeu, e quando a sua luz caiu em cheio na parede ela se tornou transparente como um véu de gaze, e a menininha pôde enxergar a sala do outro lado. Na mesa se estendia uma toalha branca como a neve e sobre ela havia um brilhante serviço de jantar. O ganso assado fumegava maravilhosamente, recheado de maçãs e ameixas pretas. Ainda mais maravilhoso era ver o ganso saltar da travessa e sair bamboleando em sua direção, com a faca e o garfo espetados no peito!


Então o fósforo se apagou, deixando à sua frente apenas a parede áspera, úmida e fria.


Acendeu outro fósforo, e se viu sentada debaixo de uma linda árvore de Natal. Era maior e mais enfeitada do que a árvore que tinha visto pela porta de vidro do rico negociante. Milhares de velas ardiam nos verdes ramos, e cartões coloridos, iguais aos que se vêem nas papelarias, estavam voltados para ela. A menininha espichou a mão para os cartões, mas nisso o fósforo apagou-se. As luzes do Natal subiam mais altas. Ela as via como se fossem estrelas no céu: uma delas caiu, formando um longo rastilho de fogo.


"Alguém está morrendo", pensou a menininha, pois sua vovozinha, a única pessoa que amara e que agora estava morta, lhe dissera que quando uma estrela cala, uma alma subia para Deus.


Ela riscou outro fósforo na parede; ele se acendeu e, à sua luz, a avozinha da menina apareceu clara e luminosa, muito linda e terna.


- Vovó! - exclamou a criança.


- Oh! leva-me contigo!


Sei que desaparecerás quando o fósforo se apagar!


Dissipar-te-ás, como as cálidas chamas do fogo, a comida fumegante e a grande e maravilhosa árvore de Natal!


E rapidamente acendeu todo o feixe de fósforos, pois queria reter diante da vista sua querida vovó. E os fósforos brilhavam com tanto fulgor que iluminavam mais que a luz do dia. Sua avó nunca lhe parecera grande e tão bela. Tornou a menininha nos braços, e ambas voaram em luminosidade e alegria acima da terra, subindo cada vez mais alto para onde não havia frio nem fome nem preocupações - subindo para Deus.


Mas na esquina das duas casas, encostada na parede, ficou sentada a pobre menininha de rosadas faces e boca sorridente, que a morte enregelara na derradeira noite do ano velho.

O sol do novo ano se levantou sobre um pequeno cadáver.


A criança lá ficou, paralisada, um feixe inteiro de fósforos queimados. - Queria aquecer-se - diziam os passantes. Porém, ninguém imaginava como era belo o que estavam vendo, nem a glória para onde ela se fora com a avó e a felicidade que sentia no dia do Ano­Novo.
 
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