Pachukanis foi um dos líderes
da escola dos juristas marxistas soviéticos dos anos de 1920. Seu pensamento
trabalhou toda a estrutura da nova ordem política que se estabelicia na União
Soviética. Considera o direito como uma relação social especifica,
representando em última instância, a relação social de troca entre possuidores
de mercadorias, incluindo força de trabalho, marcado pela existência de aspirações
autodestrutivas e portadores de interesses de um grupo ou classe dominante. Sua
críticas são desconcertantes. Problematiza
o direito na tentativa de desvendar o segredo do Estado e das formas políticas
capitalistas. Desmascarando com maestria o “direito burguês não-genuíno”,
semelhante ao “direito burguês sem burguesia” apresentado por Marx em Crítica
do Programa de Gotha.
Os argumentos de Pachukanis se
mostram ousados para seu tempo de modo bastante original. Dialogando
diretamente com a tradição marxista. Tanto no que tange à concepção da forma jurídica,
quanto ao método de abordagem teórica, no que concluiu que o direito é uma
forma burguesa que atinge o máximo de seu desenvolvimento no capitalismo e que
deve ser extinta quando da superação deste modo de produção.
Com efeito, segundo Pachukanis
é possível compreender que o movimento pelo qual o homem é alienado, pela
circulação mercantil, à condição de sujeito de direito é, ao mesmo tempo, o
movimento que torna possível a produção capitalista. Pois o homem delimitado a
sujeito de direito é alçado assim, ao mesmo tempo, a mercadoria – ele torna-se
proprietário de si mesmo, capaz de vender a si mesmo sob a forma da mercadoria
força de trabalho. Essa lógica é
devastadora na medida que indica o cerne de um debate que devemos travar sobre
a legitimação do direito. Pode-se dizer que se trata de um pensamento
primordial, por retratar a busca pela raiz mais cara ao modelo de um sistema
capitalista.
A partir de 1930, com a
ascensão de Stalin, o pensamento de Pachukanis passa a ser altamente conflitante
com a linha política seguida pelo governo soviético. Sofrendo violentos
ataques, sobretudo de Vichinsky, que assume a liderança do campo jurídico na
União Soviética com uma concepção normativista do direito. O próprio Pachukanis
é forçado a aceitar a nova orientação teórica agora dominante e a abjurar o seu
livro, que cai no esquecimento por um longo período, que nem o fim do
stalinismo nos anos 50 viria interromper. Apesar de Pachukanis ter sido
“reabilitado”, em 1956, o seu livro só seria republicado em 1980, em uma
coletânea de trabalhos intitulada Izbrannye proizvedeniia po obschei teoriia
prava i gosudarstvo [Obras escolhidas de teoria geral do direito e do Estado]. Traduzido para o inglês, em três diversas
traduções e uma reedição, para o espanhol, com três edições, para o japonês, já
em 1930 (além de outras que se seguiram a esta), para o turco, para o sérvio, e
para o italiano (duas edições), entre outras. Em português, foi editado em
Portugal pela editora Centelha, de Coimbra, em 1977, e, no Brasil, pelas
editoras Acadêmica (1988) e Renovar (1989).
Preso em 20 de janeiro e
condenado em 4 de setembro de 1937. Pintado como "inimigo do povo" acabou
“sumido” por ordem de Stálin, em 1937. De todo modo, seu legado ultrapassou os
limites do debate soviético para se tornar
uma das principais referências na pesquisa marxista sobre o direito.
Alheio aos limites do seu tempo, é certo que seu pensamento, quando bem
contextualizado, adentra no âmago do debate sobre a sociedade contemporânea.
Dica de leitura
Marxismo e Direito – Um Estudo
sobre Pachukanis. São Paulo, Boitempo editorial, 2000.
Márcio Bilharinho Naves.
CERRONI, Umberto, O pensamento
jurídico soviético, trad. Maria de Lurdes Sá Nogueira, Póvoa de Varzim, Publicações
Europa-América, 1976.
Por Claudio Castoriadis